Pela primeira vez, acho que encontrei algo que me desperta o sentimento de pertencimento: a fotografia. 

Sempre quis ser "alguma coisa", acho que para a mulher negra o sentimento de ser vista e ouvida é uma necessidade. Num contexto de exclusão e invisibilidade ter oportunidade para pertencer ao mundo de alguma forma é algo que nos motiva cada vez mais buscar mecanismos para se expressar enquanto um corpo negro. 

Corpos negros foram e são subalternizados, os processos de desumanização e objetificação influencia inclusive a não nos enxergarmos como indivíduos que devem buscar seu lugar no mundo, algo que nos foi negado no sistema escravista.

Não conhecemos nossas histórias, nos foram arrancados todo e qualquer poder politico e social. Houve um apagamento de nossos conhecimentos enquanto povo. Nossa existência começa antes da escravidão, tínhamos ideologias, conhecimentos, conceitos e toda uma organização de sociedade que foi interrompida e apagada com a nossa vinda forçada para sermos escravizados.

Este apagamento não é só físico e sim cultural, religioso, de classe e gênero. A necessidade de se enxergar enquanto ser humano que é capaz de ocupar um lugar que não seja só de subserviência é algo que desperta cada vez mais em nós. Muitas são as formas de negação do corpo negro, seja ela na arte, política, escrita, moda, entretenimento e por aí vai, mas estamos avançando na caminhada para nos tornarmos visíveis e não só um corpo biológico. 

Sabemos as histórias, as invenções, criações, estudos, teorias de pessoas brancas desde alfabetização. E a nossa história? pessoas negras não produziram? Temos que buscar nossas identidades e habilidades mesmo que o resto do mundo nos diga que não somos capazes ou duvidem de nós.

Ouvi certa vez, de uma pessoa (branca) que eu não deveria utilizar certa ferramenta de comunicação da internet por não ter carisma suficiente para isso e eu acreditei no que ela disse e na primeira tentativa de tentar me comunicar por lá, eu falhei e não consegui me expressar e só lembrava dessa frase. É assim que passamos anos de nossas vidas, acreditando que não somos capazes de realizar certas coisas, de escrever, de ensinar, de criar, de empreender, porque existe um sistema que nos faz acreditar que nascemos para servir.

Como mudar isso individualmente numa estrutura que alimenta esse sentimento? Estou num processo de descobrimento, e o que eu posso dizer é que para quebrarmos barreiras é necessário enfrentá-las, estou caminhando neste processo lento e dolorido que é se reconhecer capaz e buscando meu lugar no mundo através da fotografia, da escrita e tantas outras coisas que me propus a fazer. 

Ocupar espaços e trazer outras pessoas negras é o meu maior objetivo. Chegar a qualquer lugar que for sozinho não vale de nada a caminhada.

E você o que tem feito para pertencer ao mundo?